Ricardo Machado é voluntário do Greenpeace/RJ |
Texto de Ricardo Machado*
Consumir sem consumir a Mãe Terra e o Irmão Homem
A prática do consumo sustentável significa mais do que a
soma das partes. Ele deriva de relações saudáveis, éticas, democráticas,
equânimes e socialmente justas.
Nos últimos anos, verificamos alguns avanços na forma de
pensar e agir do ser humano. O grande desafio é de motivar e modificar o
pensamento das pessoas em relação ao consumo.
Nosso planeta, com recursos naturais vastos, mas finitos,
sofre uma degradação ambiental antiga e contínua. O ser humano, principal ator
da degradação ambiental, sofre as conseqüências do desrespeito ao meio ambiente
em sua vida. A mudança de atitudes na sua postura em relação ao meio ambiente é
fundamental para que haja uma transformação. Não resta a menor duvida, estamos
diante de um modelo de produção e consumo nitidamente insustentável, já que consumimos
mais recursos naturais do que o planeta consegue repor. Isto é, a Terra não
está conseguindo repor ar respirável, água limpa e terras sadias, além de não
estar conseguindo absorver os resíduos produzidos pela humanidade a uma
velocidade compatível com o seu uso ou produção. E isso acontece quando dos
quase sete bilhões de habitantes da Terra, somente 1,7 bilhão aproximadamente
conseguem consumir sem restrições. Se todas as pessoas do mundo consumissem
como os habitantes mais ricos, seria necessário quatro planetas Terra para
atender a demanda.
Da relação existente entre as cadeias de produção e o
consumo surge à necessidade de refletir sobre o processo do consumo
sustentável.
Consumo sustentável é o ato de adquirir, utilizar e
descartar bens e serviços com respeito ao meio ambiente e à dignidade humana.
Consumo Sustentável quer dizer saber usar os recursos naturais para satisfazer as
nossas necessidades, sem comprometer as necessidades das gerações futuras. (Relatório
Brundtland, 1987)**.
Um comportamento ambiental consciente tem que ser encarado
como uma prática de sobrevivência para todos nós, e para gerações futuras. E
exige somente mais atenção com o que está a sua volta.
No dia a dia nos deparamos com várias situações, das mais
simples as mais complexas, tais como atitudes profissionais, com a família e o
meio ambiente. O critério usado para a tomada de decisão tem que ser repensado
uma vez que as atitudes tomadas trarão a curto ou longo prazo conseqüências
futuras para o desenvolvimento sustentável, refletir sobre as atitudes tomadas define
como estamos convivendo não só com a sociedade, mas também com os recursos naturais,
cada opção tem influencia direta com a Mãe Terra.
O consumo sustentável depende da disponibilidade de bens e
serviços sustentáveis. Assim existe um binômio, a produção sustentável está
associada ao consumo sustentável. O que produzir, descartável ou retornável?
Para que produzir, para suprir as necessidades ou para ostentação e acumulo de
capital? E para quem produzir, para uma minoria dominante ou maioria excluída?
E como consumir? A adesão ao consumo sustentável se faz questionando como, por que,
o que, de quem comprar, como usar e como descartar. Ou seja, implica
necessariamente, na redução do volume de bens e serviços produzidos e na
maneira de consumo da sociedade.
Adquirir apenas o necessário para uma vida digna, minimizar
o desperdício e a produção de rejeitos e resíduos, consumir apenas bens e
serviços produzidos que não agridam o meio ambiente, motivar processos
agrícolas (principalmente a agricultura familiar, cooperativas, comercio justo),
proporcionar políticas que se preocupem com questões sociais, culturais e ambientais
tanto na produção como na administração mediante parâmetros éticos e conhecer o
ciclo de vida dos produtos-CVP, se preocupando com todos os elos da cadeia de
produção desde a extração de matéria prima até o descarte, do berço ao túmulo,
mediante selo de certificação são algumas das ações em prol do consumo
sustentável.
O problema é que existe uma relação inversa entre aqueles
que tem acesso aos bens e serviços de consumo, originados com base na obtenção,
direta ou indireta, dos recursos naturais, e aqueles que sofrem com a
degradação ao meio ambiente causada pelos primeiros.(minoria dominante e maioria
excluída) De um lado está a parcela da sociedade que tira de inúmeras formas
proveito do meio ambiente, por ter a propriedade dos bens naturais e por poder
adquirir os bens e serviços, ao passo que do outro restou a parcela da
sociedade que, além de não conseguir tal acesso, ainda é obrigada a arcar com o
passivo ambiental alheio.
O conceito adequado de sustentabilidade remete a uma
dimensão mais ampla e que extrapola esta visão egoísta dos que faturam com a
ciranda financeira, com a especulação, a “doença do lucro”, com o sobe e desce
das taxas de juros e do câmbio. O consumo sustentável está relacionado com
responsabilidade social, não com investimento. Sustentabilidade é algo que reside
na alma e não apenas uma ferramenta que engorda a conta bancária.
Vale apontar um falso dilema quanto ao custo dos produtos
sustentáveis. Isto fica claro quando se pensa no curto e no longo prazo. No
curto prazo, por vezes, um produto sustentável será mais caro. Mas, dado o fato
de que o produto sustentável não terá impactos negativos sobre a sociedade e o
meio ambiente, a longo prazo o consumidor não terá que pagar os custos sociais e
ambientais que certamente existem no consumo de produtos não sustentáveis. Esta
é a troca. Naturalmente, com a saúde em jogo, eu não penso duas vezes em fazer
a escolha por pagar um pouco mais hoje para não ter que pagar a mais no futuro
com uma moeda denominada saúde.
O consumo sustentável , que o capitalista não faz questão de
ver, tem muito com a redução da pobreza, com os direitos das crianças e
adolescentes, com o acesso à educação e ao trabalho, com a solidariedade, com o
respeito à biodiversidade. A sustentabilidade está vinculada à valorização dos
saberes e conhecimento tradicionais e inclui tanto os gestores das corporações
quanto os povos da floresta, ribeirinhas, agricultores familiares...
A prática do consumo sustentável significa mais do que a
soma das partes. Ele deriva de relações saudáveis, éticas, democráticas,
equânimes e socialmente justas.
* Ricardo Machado é Ambientalista, Administrador de Empresas, Pós Graduado em
Planejamento e Gestão Ambiental, Voluntário do Greenpeace/RJ
** O termo Desenvolvimento Sustentável é consagrado no
relatório Nosso futuro comum, produzido pela Comissão mundial sobre o Meio
Ambiente e Desenvolvimento, presidida pela norueguesa Gro Harlem Brundtland, a
pedido da ONU, e publicado em 1987.
2 comentários:
Conheço pessoalmente esse guerreiro. Ricardo tem muita experiência, além de contato e participação direta, corpo a corpo com a causa ambientalista e não é de hoje. Seu texto revela toda sabedoria adquirida, ao mesmo tempo que traduz com simplicidade a solução. Valeu Ric!
Simplesmente correto!!!
Postar um comentário